Presidente da Catalunha levado a tribunal por referendo independentista

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A relação entre Catalunha e Espanha ficou ainda mais complicada esta semana. O atual presidente da comunidade autônoma, Artur Mas, depôs nesta quinta-feira (15) na justiça espanhola, acusado do delito de desobediência por organizar consulta sobre a independência da Catalunha, em 9 de novembro de 2014. Naquela ocasião participaram cerca de 2,5 milhões de votantes (menos da metade do eleitorado), sendo que 80% manifestaram apoio à formação do estado catalão.

O que mais chamou atenção foi o apoio popular manifestado em frente à sede do Palácio da Justiça, em Barcelona, onde mais de seis mil pessoas aplaudiram Artur Mas, na entrada e na saída. Ele chegou acompanhado por um séquito de 400 prefeitos de municípios da Catalunha e diversas lideranças políticas, sendo recepcionado pela multidão que já o esperava desde as primeiras horas da manhã. O episódio ganhou destaque na mídia internacional.

O Tribunal Constitucional (TC), a corte suprema da Espanha, proibiu a consulta informal sob o argumento de que apenas o governo central tem a prerrogativa para organizar referendos. No depoimento, Artur Mas se declarou como único responsável pela consulta independentista. Contudo, se recusou a responder as perguntas da acusação, alegando estar sendo perseguido politicamente.

Na terça-feia (13), a ex-vicepresidenta da Catalunha, Joana Ortega, e a secretária de Educação, Irene Rigau, estiveram no tribunal para depor, acusadas do mesmo delito. As duas foram acompanhadas por todos os secretários do governo e uma multidão que se fez presente às portas do órgão judicial. No mesmo dia, a magistratura emitiu um inusitado comunicado, alegando que a manifestação popular pretendia quebrar a independência judicial e “influenciar a sua decisão”.

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DEPOIMENTO – Depois de depor, Artur Mas concedeu entrevista coletiva, na qual explicou sua versão sobre o 9N. Ele afirmou que quando o TC expediu a proibição, a menos de uma semana da consulta, o processo já estava em curso. E alegou que a organização e contagem de votos foram realizadas por 40 mil voluntários, sem que houvessem sido dadas ordens. “A Generalitat (governo autonômico) informava, facilitava e ajudava, mas não dava instruções”.

Mas credita a denúncia contra ele e sua equipe à raiva do governo espanhol pelo êxito da mobilização cidadã, que teve ampla repercusão internacional. “O sucesso da democracia nunca deveria terminar nos tribunais de justiça”, arrematou.

A queixa-crime (querella, em espanhol) foi impetrada pelo próprio governo da Espanha. Inicialmente houve resistência dos promotores da Catalunha por não vislumbrarem conduta delitiva na ação dos acusados. Por conta disso, houve a intervenção do Promotor Geral do Estado, máximo representante do Ministério Público, instituição que na Espanha não tem independência funcional. Assim, o processo chegou ao Tribunal Superior de Justiça da Catalunha, órgão encarregado de organizar o julgamento.

Uma das queixas de Mas, explicitada na entrevista, é que o próprio governo da Espanha já descumpriu inúmeras vezes sentenças do TC, especialmente no tocante a disputas entre o poder central e as comunidades autônomas, sem nunca ter sido acionado judicialmente. Esta é a primeira vez que se acusa pela via penal um representante político por desobedecer o tribunal, cujos membros são indicados politicamente.

O primeiro ministro espanhol, Mariano Rajoy, saiu em defesa do poder judiciário, acusando a Mas de ameaçar o tribunal. “As manifestações, ameaças e presenças intimidatórias perante os tribunais de justiça são absolutamente inaceitáveis”. “A Justiça é quem garante os direitos e as liberdades e é asism que tem que ser encarada”.

Coincidentemente neste 15 de outubro completava 75º aniversário do fuzilamento de Lluís Companys, presidente da Catalunha, por ordem de um tribunal militar espanhol, durante a ditadura de Franco. Com o fim da guerra civil espanhola e a abolição do autogoverno na Catalunha, Companys seguiu o caminho do exílio, mas foi capturado pelos nazistas na França ocupada, sendo logo entregue as autoridades franquistas.

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Companys é o único presidente eleito democraticamente na Europa que foi condenado à pena capital. Muitos catalães lembraram a data deixando velas acesas em suas varandas em memòria ao presidente fuzilado. A revindicação é de que o governo espanhol peça desculpas pelo acontecido, como já fizeram os governos da França e da Alemanha, e anule o processo militar que ditou a sentença de morte.

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