Xoxinho. Diário de Viagem #4: Crônicas entre Barcelona – Recife, março de 2020

*Por Flávio Carvalho

“Traga a panela pra eu bater no fundo dela com o cabo da colher; oi se não tem feijão, vamos fazer um arrasta-pé, mulher”, Roberto Ribeiro.

Bolsonaro vai cair. Anote aí. Quem vai derrubar ele? O vírus? O povo? Não. A Globo. A história se repete, como tragédia ou como farsa – dizia o velho Carlos.
Da desgraça, nascem pérolas. O vídeo do jogador de futebol, em casa, com os filhos, inventando experimentos científicos. Que lindo. No rádio, a mulher dele: “por um dia somente que ele faz (!); e eu que fico com esses três meninos todos os dias, enquanto ele vai por aí”. Não parecia satisfeita com a inédita – histórica – iniciativa do marido.
Na TV, armaram entrevista ao vivo com o secretário de educação, de terno e gravata (calor danado!), entregando os primeiros kits de “merenda” para as famílias que estarão sem escola nesses dias. “Só isso?! Não disseram que ia ser uma merenda completa? Mas isso é só um lanchinho. Não vai dar pra nada. É xoxinho demais”, respondeu-lhe ao vivo e a cores, a primeira mãe, decepcionada, ao receber o “lanche” da mão do secretário.
“Lave as mãos, lave as mãos… Gostaria muito. Mas aqui estamos há cinco dias com falta de água”. “Fique em casa e não use o ônibus, fique em casa… E eu que preciso levar o meu marido pra fazer hemodiálise, agora que as ambulâncias estão ainda mais difíceis?”.
Na Catalunha, fábrica de máscaras convoca voluntários para a produção e distribuição gratuita, diante da pandemia. Em Goiás, ladrões arrombaram um centro de saúde comunitária e roubaram todo o estoque de máscaras. Em Curitiba, a polícia prendeu os fabricantes de álcool-gel adulterado, fabricado em péssimas condições. A informação pública orienta que não se deve misturar álcool normal e gelatina de cozinhar; pode provocar sérios problemas de saúde.
Na Itália, morreu a empregada doméstica da brasileira que lhe contaminou com o vírus, obrigando-a a trabalhar nesses dias de confinamento. No Brasil, empregada doméstica e confinamento combinam já faz muito tempo.
O técnico informático diz que só poderá programar visita daqui a um mês, agora que tanta gente necessita conectar-se à internet. O “consertador de bicicleta” já não dá conta da imensa demanda. Um velho amigo contratou ajudante na sua pequena oficina: técnico de consertar ventilador. Fazer o quê? Com esse calor.
O país não pára. Vai ser muito difícil manter esse povo em casa.
Em Barcelona, continua a onda solidária da brasileirada, voluntária, oferecendo todos os tipos de serviços virtuais, via Internet: orientação aos filhos de brasileirinhos e o português como Língua de Herança, terapias alternativas, exercícios físicos, escolares e muita arte – principalmente.
O empresário – de Brasília – pegou seu jatinho privado, convocou trabalhadores e foi à praia de Porto Seguro… Aproveitou o “bom momento” para pegar uma prainha. Até que foi denunciado por um empregado. E fugiu.
Nunca havíamos imaginado que fosse tão importante isso do Presidente dar o (bom ou mau) exemplo. Dezenas de vídeos ensinando como usar (ou como não usar) a máscara sanitária. Em depoimento para a toda nação, o Presidente do Brasil, foi capaz de demonstrar que o ridículo é um poço sem fundo. E é nele que ele vai cair. Anote aí.

*Flávio Carvalho é sociólogo
cbrasilcatalunya@gmail.com
@quixotemacunaima @1flaviocarvalho

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.