Futuro sorri, em Madri, para “ex-menino da mala”

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Adou ao ser entregue à mãe, em Ceuta, em julho do ano passado (JORGE LOPEZ – EFE)

Um futuro com dias melhores parece estar se desenhando para o pequeno Adou Ouattara, de 8 anos, e sua família. O garoto, que protagonizou um dos casos de maior repercussão de imigração ilegal na Espanha, no ano passado, vive agora em Madri com a mãe, Lucie, o pai Ali Ouattara e a irmã Marie, 13. Ele chegou ao país, através de Ceuta, em maio de 2015, dentro de uma mala de viagem. A imagem de raio-x feita na época rodou o mundo.

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A criança foi transportada pela marroquina Fátima Y, de 19 anos, flagrada por agentes da Guarda Civil Border Tarajal, que desconfiaram do nervosismo da jovem e resolveram escanear a mala. Após a descoberta, Adou foi internado em um centro para menores em Ceuta, enquanto o pai e Fátima foram presos.
Ali Ouattara, 42, natural da Costa do Marfim, foi liberado um mês depois mediante o pagamento de fiança no valor de 5 mil euros (R$ 20,4 mil). O dinheiro veio de doações feitas por estrangeiros que se penalizaram da situação da família. O menino foi entregue à mãe três meses depois. A jovem que o transportou continua presa.
Morando à época na ilha de Forteventura, nas Canárias, e com permissão de residência na Espanha, Ali havia pago a pessoas contactadas no Marrocos para que seu filho cruzasse a fronteira em segurança. Só não sabia que o garoto iria ser transportado daquela forma, como alegou em sua defesa.
O menino, que agora recuperou o sorriso, está frequentando a escola, joga futebol e pediu ao pai para inscrevê-lo em um clube do bairro. Seu ídolo é o jogador Messi, do Barcelona, e o prato favorito é a tortilha,  típico da cozinha espanhola, à base de batatas e ovos.
Chegar até este ponto, contudo, não foi fácil. Para começar, sua família teve que se deslocar de Forteventura, para a capital espanhola, fugindo da “fama” indesejada de Adou. “Ele é o principal para nós”, destaca o pai. A decisão de se mudar para Madri foi tomada há quatro meses. “Decidimos sair porque Adou não aguentava mais. No supermercado, na rua, na escola, todos o chamavam de ‘o menino da mala’ e ele não queria ser chamado assim “, explica Ali.
Na época, Ali tinha deixado de trabalhar por conta de problemas de saúde na lavanderia onde prestava serviços desde 2007. Ele conta que a partir de 2012 começou a sentir fortes dores no peito devido ao esforço de carregar peso, o que o obrigou a se afastar em várias ocasiões do trabalho. “Se não trabalhava, não recebia. Depois vieram os problemas com Adou. Então falei com minha esposa e decidimos partir”, conta, ao explicar que escolheu Madri porque na cidade mora uma prima de Lucie, que está dando uma mão à família.
Segundo ele, esta foi a melhor decisão. “Adou está muito bem aqui, onde aprende espanhol sem muita dificuldade. Já fez muitos amigos e ninguém aponta o dedo para ele ou faz perguntas, simplesmente porque não sabem da sua história”, relata, ao dizer que o garoto “recuperou o anonimato”. “Agora ele é apenas mais uma criança entre os demais e está feliz”, completa.
Ali não para de buscar trabalho desde que chegou a Madri, em dezembro passado. Nestes três meses apenas encontrou biscates em cidades vizinhas, como Múrcia, Zaragoza e Bilbao. “Eu vou uma ou duas semanas e depois volto, mas quero encontrar um emprego estável. O objetivo é estar junto com minha família, mas vamos ver se eu tenho que ir para a cadeia “, relata.
Ele refere-se ao pedido de três anos de prisão, feito pela promotoria espanhola há duas semanas. A promotoria acredita que ele é o responsável pelo transporte de Adou dentro da mala, onde correu risco de vida. Ali diz que assumirá “com dignidade” qualquer sanção, embora ache que ficar preso três anos seja “bárbaro”, uma vez que não tinha ideia da forma como iriam transportar o menino.
“Eu não sou um traficante. Eu sou uma pessoa honesta, que estava numa situação desesperada. Se eu tivesse conhecimento sobre a mala, não teria aceitado. Eu não sou mau, sou honesto”, se defende. O pedido de prisão de três anos veio após Ali ter rejeitado o cumprimento de pena de um ano, proposta em dezembro passado, que implicava em reconhecer a culpa no caso.

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Ali, o menino Adou, o advogado da família, e a mãe Lucie

Ali Ouattara disse que não se sente “culpado” do que aconteceu com seu filho porque foi “enganado”. Numa entrevista coletiva, que concedeu logo após a divulgação do caso, ele disse que tentou duas vezes levar o filho para a Espanha através de reagrupamento familiar. Mas o governo recusou o pedido sob a alegação de ele não possuía renda suficiente para manter toda a família. “Concordei em pagar para trazerem meu filho pelo desespero em que me encontrava. Nessa situação, às vezes fazemos coisas que não queremos fazer”, alegou.

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